31/08/2014
O cenário, infelizmente, já é familiar:
com a taxa de desemprego no país pouco acima de 7%, as empresas enfrentam uma
árdua batalha para evitar que seus funcionários sejam levados pela concorrência.
O caso é especialmente sério quando se fala em cargos operacionais de baixa
remuneração, nos quais a rotatividade bate recordes, e em jovens, que são vistos
pelas companhias como recursos estratégicos para ocupar futuros cargos de
liderança, mas impacientes em relação ao avanço na
carreira.
Diante desse desafio, uma das
estratégias de retenção que vêm ganhando força nas empresas é se aproximar dos
familiares dos funcionários, fazendo com que, no momento da troca de emprego, o
voto deles pese a favor da permanência do profissional na companhia. As
iniciativas vão desde simples ações que envolvem mais os parentes no dia a dia,
como visitas aos escritórios e festas em datas especiais, até programas mais
abrangentes, que estendem benefícios e capacitam membros da família, buscando
inclusive trazê-los para o time de funcionários no futuro. "Há cada vez mais uma
preocupação em gerar um bem-estar para o funcionário e para a comunidade na qual
ele está inserido. Ao trazer a família para perto, ele se sente mais em casa na
empresa", diz Elton Moraes, gerente do Hary Group.
A estratégia também
vem sendo empregada por empresas que buscam conquistar o público jovem e
convencê-lo a permanecer por mais tempo sem seu quadro. A ideia é que, como os
jovens estão saindo mais tarde de casa, eles dependem mais da família tanto para
decisões financeiras quanto de carreira. Por isso, os pais vêm sendo chamados
nos processos de integração. "É muito importante ter os pais como aliados na
hora em que ele quiser desistir da vaga, seja porque surgiu uma dificuldade,
seja porque apareceu uma oportunidade. Nas conversas com os jovens, percebemos
que a opinião deles realmente conta na decisão", diz Adriana Chaves, diretora de
desenvolvimento e carreira da DMRH. A consultoria Deloitte começou a envolver os
familiares dos trainees no processo de integração em 2009. A cada nova turma que
ingressa na companhia, os pais são convidados a participar de um evento de um
dia inteiro para conhecer melhor o negócio e os desafios que seus filhos terão
pela frente. Mais de 1 100 pais e mães já participaram do processo. Além de
permitir que os familiares tirem todas as dúvidas, a empresa abre um canal para
que eles conversem com os gestores se precisarem. A programação também inclui
uma palestra com um especialista sobre conflito de gerações, que aborda a
educação do jovem Y e suas implicações no ambiente de trabalho. "É uma geração
do video-game, que quer sempre um novo desafio maior e mais rápido. É importante
que os pais entendam isso, pois a opinião deles é ouvida e valorizada nessa
fase", diz Sônia Romeiro, gerente sênior de talent da
Deloitte.
A KPMG, que, como a Deloitte, atua no
segmento de consultoria, também convoca os pais com o objetivo de, juntos,
convencer os jovens a assumir um compromisso de longo prazo com o negócio. Para
envolver os familiares no processo de integração, envia à casa dos trainees um
convite (com direito a pipoca e refresco) para que todos participem de uma
videoconferência de boas-vindas. Ao fim da apresentação institucional, promove
um talk-show com o presidente, momento em que os pais também podem enviar suas
dúvidas. "Procuramos trazer casos de sucesso, histórias de profissionais que
mostram que a dedicação valeu a pena", diz Carolina Coelho, coordenadora de RH
da KPMG no Brasil. A iniciativa começou em 2012 e, segundo Carolina, já
contribuiu para uma redução de 7% no turnover nessa faixa do
quadro.
De forma diferente, mas com o mesmo
propósito de conter a fuga dos jovens, a distribuidora de energia Elektro trouxe
a família para dentro da empresa. "O estágio começa no segundo semestre, termina
em novembro, mas só contratamos em janeiro. O problema é que alguns passavam em
diversos processos e acabavam escolhendo outra empresa", diz a gerente de RH,
Noemi Oga. EM 2013, a empresa começou a convidar os familiares dos futuros
estagiários para conhecer a empresa após a aprovação. Além de uma visita às
instalações da companhia, a agenda inclui conversa com os gestores de todas as
áreas e com o presidente. O resultado foi positivo: na primeira turma de 40
estagiários que passou pela atividade, o turnover foi reduzido a
zero.
Embora reconheça que a estratégia possa
funcionar para algumas empresas, Rosana Rodrigues, sócia de Choice Consultori,
recomenda usá-la com parcimônia. "Em muitos casos, o problema dessa geração tem
a ver com maturidade. É importante refletir se, ao trazer os pais para o
processo, não se está atrasando esse desenvolvimento".
Tragam os
filhos
Na Armco Staco, indústria metalúrgica, o
caminho é inverso. O Projeto Nossos Filhos prepara os filhos de funcionários
para o mercado de trabalho. Todos os anos, aqueles que estão se formando no
ensino médio são convidados a participar de um evento no qual recebem dicas de
como montar um currículo, como tirar carteira de trabalho, além de participar de
simulações de dinâmicas de grupo e entrevistas. Eles também passam a ter acesso
a vagas, enviados por e-mail - não só na própria Armco como
também em empresas parceiras. A iniciativa, que existe desde 2000, já capacitou
mais de 500 jovens. Jonatas Canuto foi um deles. Filho de Joaquim Jonas Canuto,
que está há 20 anos na Armco Staco, ele participou do Projeto Nossos Filhos e
ingressou como jovem aprendiz na empresa. Ao terminar o período legal para esse
tipo de trabalho, ainda não havia vagas. Ele deixou a Armco Staco por algum
tempo, mas, quando a oportunidade surgiu, foi convidado a voltar. Hoje, quem
espera sua vez é o filho mais novo de Joaquim de 12 anos. "O sonho dele é entrar
no programa e seguir carreira na Armco também", diz o pai.
"A aproximação com a família pode colocar barreiras à saída do
funcionário, principalmente daqueles que atuam em funções cuja remuneração não é
alta"
Segundo Luciana Bastos, gerente de
recursos humanos, a iniciativa nasceu como um projeto social voltado para
afastar jovens de atividades pouco saudáveis e perigosas, mas acabou se tornando
uma importante ferramenta de retenção. "O mercado está aquecido, as pessoas
trocam de emprego com facilidade. Mas, se a mulher ou o filho do funcionário
gosta da empresa, eles incentivam a ficar", diz a
executiva.
A fabricante de automóveis Fiat também
aposta nesse conceito. Ao longo do ano, a empresa promove diversos eventos para
os funcionários e seus parentes. Um dos favoritos é o Estação do Amor, um jantar
romântico acompanhado de show ao vivo em que mais de 2500 funcionários e seus
namorados, parceiros ou cônjuges celebram a paixão. Outro programa de sucesso é
o baile de debutante, oferecido anualmente a todas as filhas de funcionário que
completam 15 anos, com direito a comes e bebes , banda , transporte até a festa
e mesa para 30 convidados. Cerca de 90% dos funcionários de todos os níveis - da
gerência à operação - com filhas na idade participam desse momento, com 300
debutantes celebrando a ocasião todos os anos. "Todos os meses temos pelo menos
uma ação envolvendo a família. É uma forma de estar presente na vida social do
funcionário, sem forçar a barra", diz Adauto Duarte, diretor do RH da Fiat
Chrysler.
Para Renato Meirelles, presidente do
instituto de pesquisas do instituto de pesquisas Data Popular, esse tipo de
iniciativa coloca barreiras à saída do funcionário, principalmente dos que atuam
em funções cuja remuneração não é alta. "Quando você cria esse ecossistema, o
ônus passa a ser muito maior do que simplesmente trocar um salário por outro",
diz. Segundo ele, algumas empresas também têm utilizado a técnica para aumentar
a assiduidade em call centers e em outras funções operacionais. "Elas criam um
benefício, como uma cesta básica para a mãe, e com isso ganham um aliado que
reforça o comprometimento do empregado com a
empresa."
Na Renault, a estratégia é trazer a
família para as dependências da companhia sempre que possível. Duas vezes por
mês , a empresa promove visitas guiadas de familiares à fábrica, em São José dos
Pinhais, no Paraná. São oferecidos 60 vagas por turma, e a procura sempre é
maior do que a oferta. O objetivo é causar a melhor impressão possível. Por
isso, a experiência começa com uma van , que vai até a casa do funcionário
buscar a família. Ao chegar ao complexo, eles são recebidos por uma equipe de
recreação - afinal, as crianças comparecem em peso, até mesmo as de colo - e
passam o dia conhecendo as dependências da empresa, acompanhados o tempo todo
pelo funcionário. "Ele se sente prestigiados e orgulhosos do que faz", diz Ana
Camargo, diretora de RH da Renault.
Segundo a executiva, a ação tem um impacto não só na retenção mas também na
reputação da empresa. "Eles saem daqui entendendo melhor como é o dia a dia do
familiar no trabalho e também admirando a marca. Viram verdadeiros defensores",
diz Ana.
Revista VocêRH | Jornalista Daniela
Moreira.
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